Resenhas finais dos capítulos 5 e 12, por Leonardo Branco
Análise Textural – Materializando o Espaço Midiático (capitulo 5), de André Jansson.
O autor inicia o texto afirmando que a geografia da comunicação preocupa-se “como a comunicação produz espaço e como o espaço produz a comunicação”. Nesta perspectiva os teóricos da comunicação devem incorporar perspectivas geográficas em seus trabalhos e superar a divisão analítica entre os aspectos simbólicos e material do espaço.
A textura
O conceito de textura tem sido usado dentro dos estudos de engenharia e design para estudar as características e as aparências dos materiais e superfícies. Para Jansson, a análise textural pode contribuir para uma compreensão mais robusta das configurações espaciais na sociedade informacional.
Textura – Uma Visão Geral
Em The Death and Life of Great American Cities, Jane Jacobs (1961) vai descrever uma rua em Nova York, a Hudson Street, com ênfase no caráter ritual da vida cotidiana. A visão de Jacobs está relacionada com a noção de Erving Goffman da vida social como performance em paralelo com uma hipótese que a espacialidade material-funcional de uma cidade determina não só os movimentos, mas também a vida pública, as trocas simbólicas e a práxis comunicativa.
Assim, As práticas espaciais/comunicativas estariam de acordo com os arranjos espaciais pré-existentes da cidade, bem como de acordo com as regularidades temporais. As observações de Jacobs demonstram que as práticas espaciais/comunicativas numa região tendem a seguir regras formais e informais que dizem respeito a um dado espaço e tempo.
O termo textura
Deriva-se do latim textere, significando “tecer” e refere-se tanto à coisa tecida (têxtil), e ao sentido da tessitura (textura). Para o autor a textura nos ajuda a sair do sentido de espaço como contêiner. “Permitindo conceber o espaço em termos de uma densidade comunicativa”. Desta forma, através da textura, “a comunicação torna-se o espaço, e o espaço torna-se a comunicação”. As texturas, de muitos tipos diferentes, formam uma parte essencial da vida subjetiva do mundo nessa linha de pensamento.
Os conceitos de “alocalidade” (Relph, 1976) e “não-lugares” (Augé 1995) reduzem as possibilidades de se constituir sentidos para as lugares que são impulsionados por grandes fluxos de pessoas (aeroportos e estações de transportes em geral) que são considerados como “não-lugares” universais se pensarmos neles somente como núcleos de transporte. Contudo, para Jansson, ao estudarmos detalhadamente esses espaços no sentido das texturas encontramos arranjos espaciais-comunicativos específicos e que se diferenciam no espaço e no tempo.
Nessa leitura “o espaço é tanto produzido quanto interpretado através da textura”, isto é, através de uma materialização espacial da cultura. “A textura é um mediador dos aspectos simbólico e material do espaço, mas também das estruturas espaciais e da atividade comunicativa”, isto é, a textura conecta a dimensão espacial a esfera comunicativa de cada lugar, reivindicando a importância do lugar na comunicação.
Ritmos e Escalas Texturais
Jansson vai defender que as texturas operam de acordo com diferentes ritmos e escalas geográficas. Assim, propõe estudar as texturas de acordo com três diferentes escalas: regional, institucional e global, ou seja, a textura é diferente a depender de em que nível geográfico estamos interessados.
As análises texturais em escala regional lidam com a textura dos espaços geograficamente limitados. Diz respeito, por exemplo, como a televisão contribui para a regionalização dos ambientes públicos, problematiza a midiatização de lugares diversos como as lojas de departamentos, restaurantes nos quais a TV estabelece comportamentos sociais.
As análises texturais em escala institucional lidam com conglomerados regionais, mas em termos de mecanismos organizacionais. Aqui, o ponto de partida da análise não está nos arranjos espaciais, mas nas organizações particulares da vida social. Um exemplo são as texturas produzidas dentro da indústria do turismo que transformam o sentido das notícias ou do marketing dos lugares.
A análise textural numa escala global foca-se em como as texturas criam e articulam espaços desacoplados das geografias locais. Isto é, como regiões e instituições podem ser alargadas ou localmente desacopladas – através da produção de espaços eletrônicos ou virtuais na Internet.
Texturização, Durabilidade e Mudança
Nessa parte do texto, Jansson lança a seguinte questão: o que aconteceu com Hudson Street em tempos de novas tecnologias da comunicação? o que aconteceu com tal textura desde os anos 1960? Até que ponto os novos meios de comunicação – integrados no espaço (tecnologia de vigilância eletrônica); localizados no espaço (telas de TV), ou carregados pelas pessoas pelo espaço (telefones celulares) – alteraram a textura de sua vizinhança?
Ideologia
Neste tópico vai prevalecer uma leitura política da textura onde o autor vai recorrer a Lefebvre (1974), afirmando que a textura é “uma situação de reprodução e negociação ideológica, expressando como o espaço e comunicação devem ser organizados na sociedade”. Também acredita que a informação acelerada da sociedade levou a uma mudança histórica, uma revolução textural, similar àquela imposta pelo industrialismo. Esta revolução saturou espaços públicos e privados, tanto nas estruturas materiais quanto na interação simbólica (Paul Virilio (1990).
Materialidade
Reiterando a textura como elemento de ligação entre espaço e comunicação, Jansson diz que é essencial nessa compreensão a noção de inseparabilidade das práticas espaciais e comunicativas. Vai citar como exemplo uma conversa em um ônibus onde a comunicação produz o espaço, por meio da textura, isto é, “uma conversa entre duas pessoas num ônibus, por exemplo, produz textura por meio da representação do espaço através da fala. A conversa é fundamental para a textura, pois ela toma lugar numa certa localização, que obedece as regras comunicativas de certa região”.
Textura como Campo Epistemológico
O autor encerra o artigo afirmando que a análise textural não pertence a nenhum domínio exclusivo dos estudos de comunicação. Ao invés disso tem sua fundação na teoria social e cultural, como formulada por pensadores como Goffman, Giddens e Lefebvre.
Passagens da Mídia em Espaços de Consumo Urbanos (capitulo 12), de Johan Fornäs
Fornäs abre o capítulo afirmando que “o uso da mídia é sempre espacial e temporalmente localizado, tanto representa quanto molda o espaço e o tempo. A comunicação tanto toma lugar quanto cria lugar”. Assim, da mesma forma que as galerias e lojas de departamentos do século XIX, os shopping são locais de comunicação e consumo.
Nesses lugares as pessoas interagem com imagens, sons e textos de todo tipo possível. No capítulo são destacados os aspectos espaciais dos usos de mídia, explorando conexões entre espaços de mídia, espaços de compra (shopping) e espaços urbanos.
O autor esclarece que os espaços comerciais urbanos são localidades de comunicação, mas também de poder. Eles enquadram fluxos complexos de comunicação entre indivíduos, textos e instituições.
Passagens (projeto)
O texto foi construído a partir de uma pesquisa interdisciplinar que investigou os processos interativos de comunicação e consumo num grande shopping center sueco (Solna Centre). Esse espaço foi escolhido por ter sido planejado e é usado de modo altamente abertos e ambíguos, onde não há um predomínio de um determinado tipo de publico.
Fornäs volta a afirmar que esses lugares são densamente cruzados por fluxos plurais de mídias e pessoas, convidando assim à problematização dos próprios conceitos de lugar e espaço. Assim, “os shopping centers são planejados para atrair amplos conjuntos de consumidores em potencial, e não são monopolizados por grupos sociais muito específicos, em termos de idade, gênero, profissão, classe, etnicidade ou gosto cultural”.
Contudo, “alguns shopping centers diferem em seus graus de abertura social e espacial. Alguns têm sua amplitude estreita, direcionada a um estrato populacional especializado ou a uma gama muito limitada de lojas”.
Espaços de Comunicação
A interação entre pessoas e mídias é sempre contextualizado no espaço e pelo espaço para o autor. Desta forma, “os lugares enquadram e delimitam os usos das mídias, assim como os textos midiáticos representam lugares e espaços, dando-lhes significado”.
Todavia, na percepção de Fornäs, existem limites sociais e funcionais quando relacionamos lugar e comunicação isto é, “o lugar onde se lê, ouve ou assiste não é neutro ao significado da mídia. Tendo lido um texto em casa, na escola, no metrô ou nas férias gera uma certa diferença na forma com que é vivido – mesmo quando não são conscientemente relembrados”. Logo, “nenhum lugar ou espaço pode ser pensado de forma pura, sem que hajam significados simbólicos anexos a eles”.
Nessa linha de pensamento, um shopping center é um espaço de comunicação, uma espécie de “ nodo para inúmeras redes de comunicação, porém uma unidade que em si comunica-se com seus arredores. O shopping center é uma arena constituída por “fluxos de pessoas através de espaços e mídias, e fluxos de mídias através de espaços e pessoas”.
Um Centro para Comunicação e Consumo
No shopping os visitantes encontram as mídias enquanto passam pelo centro, através de textos de muitos tipos (placas de sinalização e promoções, por exemplo). A administração do shopping e as lojas também utilizam mídias para comunicar-se internamente. Logo, o centro possui poder comunicativo.
O autor defende que cada centro tem de criar e demonstrar uma imagem de si mesmo como um lugar único e atraente. “Um lugar seguro para sentir-se em casa, mas também um atrativo centro de eventos e experiências de entretenimento”. Nessa linha o design e arquitetura também são usados como meio de comunicação para Fornäs.
Espaços de Poder
Nesse tópico há uma tentativa de politizar a leitura do espaço do shopping. A ideia de poder que orienta Fornäs entende esse componente como uma forma coerciva de comunicação, e a comunicação como uma forma de poder simbólico. Aqui o autor vai dizer que ”todas as práticas em que o uso de mídia é espacialmente localizado são também, conflitos pelo poder sobre o espaço”.
Para o autor são claros os conflitos contínuos entre lojas e cadeias de lojas individuais, staff e administração do centro, produtores e distribuidores, e visitantes e clientes de diferentes tipos.
Já a “fronteira entre privado e público é vaga, e as regras precisas quanto o que é permitido no centro não são claras. Protestos políticos são permitidos nas ruas e quarteirões, mas dificilmente quando estes são postos no shopping. Isto perturbaria o comércio”.