Abaixo, comentários sobre os capítulos 7 e 8 do livro por Thiago Falcão.
Capítulo 7: GUGGENHEIN, Michael. Mutable Immobiles: Building Conversion as a Problem of Quasi-Technologies.
Michael Guggenhein centra a discussão de seu capítulo na construção de uma apropriação da Teoria Ator-Rede que deseja desenvolver uma série de sub-conceitos para endereçar, em específico, o modo pelo qual os urban studies – e o direito – tratam edifícios como construções que, uma vez completas, livre do jugo de seus idealizadores, servem para ‘localizar interações’, de forma específica, determinada.
O capítulo se inicia com uma discussão das apropriações no uso da cidade a partir de suas mudanças, questionando, principalmente, o modo pelo qual edifícios são levados a ‘mudar de essência’, se redefinir, quando a vizinhança na qual eles se encontram estacionados passa por um processo de industrialização ou desindustrialização.
Guggenhein segue afirmando que edifícios consistem em tecnologias num duplo sentido: porque eles são construções – que possuem fins específicos independente de sua localização (um tipo de modo identitário conferido a um agente não-humano) – mas também são tipos de construção – um modo classificatório que, segundo o próprio, é da alçada de repúdio da Teoria Ator-Rede, pois esta “não se interessa por classificar os objetos em tipos”.
O autor empreende uma digressão a respeito do conceito de tecnologia para introduzir seu conceito – uma apropriação da ideia de Serres de quasi-objects – de quasi-technology: objetos que, às vezes se portam como caixas pretas, mas que, eventualmente, perdem esta qualidade. Para Guggenhein, procedimentos relativos a estas quase-tecnologias não podem ser calculados (como o são, no caso de tecnologias), porque estes dependem de categorizações situacionais que podem sobrescrever redes já existentes.
A partir daí, Michael Guggenhein inverte dois conceitos latourianos para criar suas apropriações: em primeira instância, ele argumenta que edifícios são ‘mutable immobiles’ (em contrapartida ao conceito latouriano de ‘immutable mobiles’), que são tecnologias de forma singular e que não podem ser resguardadas da intervenção externa, num movimento de pontualização comum; e o de white box – invertendo a ideia de blackboxing da ANT – que seria um movimento no qual uma rede seria reescrita a partir de substratos tecnológicos aparentemente nulificados quando da mudança na vizinhança de um edifício.
Em se fazendo, um rápido apanhado crítico com relação ao texto, as ideias de Guggenhein, apesar de serem claramente embasadas em construções da ANT, por muitas vezes deixam a desejar em sua articulação, às vezes até mesmo indo contra alguns preceitos básicos da teoria (quando da própria definição de quasi-technology, por exemplo).
Capítulo 8: GIRALT, Israel Rodriguez; GÓMEZ, Daniel López; LÓPEZ, Noel Garcia. Conviction and Commotion: On Soundspheres, Technopolitics and Urban Spaces
O capítulo 8 do livro Urban Assemblages traz uma discussão sobre o lugar do som nos urban studies. Os autores se apropriam de manifestações ocorridas em Barcelona, Espanha, para discorrer sobre a negligência que o som geralmente recebe, quando se estuda o espaço urbano. Para Giralt, Gómez e López, o som só é estudado, basicamente, partindo de dois frameworks: no primeiro, o som não rítmico é considerado barulho, enquanto o rítmico é considerado música – em assunções dicotômicas e maniqueístas.
O capítulo se enseja sempre nessa discussão, escrito de forma minuciosa e beirando o poético, com um fluxo de leitura adequado – mas não evolui teoricamente. O único uso que este faz da ANT (num livro sobre a teoria, diga-se de passagem), é para evocar a ideia de dobradura e de como estas ajudam a localizar os sujeitos numa suposta temporalidade, sendo que boa parte da discussão simplesmente ignora preceitos desta teoria.
A contribuição mais interessante do capítulo – que é de uma leitura maravilhosa – é – sem dúvida – a apropriação dos conceitos de convicção e comoção de Peter Sloterdijk para se referir ao modo pelo qual estas ‘soundspheres’ carregam, consigo, uma ética e estética que os autores identificam como ‘tecnopolítica’, onde uma tecnopolítica da comoção seria responsável por ‘produzir rebanhos’, por uma identificação bottom-up, não-hierarquizada; enquanto uma tecnopolítica da convicção seria responsável por produzir um catalisador central – figura pública, por exemplo – que opera com o objetivo de produzir uma massa, um coletivo organizado de sujeitos.